“Universotário”
Juro pra você, caro e paciente leitor, vez ou outra paro, apalermado, tentando compreender o estrago que a indústria fonográfica fez no gosto musical dos brasileiros. Minha aversão a esse ultraje à escala cromática tem origem: o forte divisor nos costumes liderado por uma turma que ousou olhar a cultura, sobretudo a música, de ponta-cabeça e agora chega aos 70 anos. Alguns até ultrapassaram a risca, outros já percorrem estradas desconhecidas. A lição é antiga, faz uns anos falei dela aqui. Quando vivia o olho dessa revolução, jovem e ingênuo, um igualmente jovem e competentíssimo professor de português nos mostrou porque, naquele tsunami (a palavra ainda não existia) de criatividade musical, uma parcela da população insistia em consumir em doses significativas a música caipira, de rimas pobres e óbvias construções melodramáticas.
“Passa pelo universo de cada um”, disse o mestre. E naquela aula, parafraseando Geraldo Vandré, um genial compositor daquele tempo de mudanças, “as visões se clarearam”. Facilíssimo: os diferentes universos aos quais cada um de nós pertence explicam não só a questão do gosto musical, mas os eventuais impasses ao apresentarmos um ponto de vista. O cara com quem você interage não precisa vir de um universo totalmente estranho ao seu, basta haver bagagens desproporcionais de conhecimento e vivência e não haverá diabo no mundo que faça um gostar de Ai Se Eu Te Pego e o outro de Águas de Março...
Minha intriga é com quem tomou os lugares de Caetano, Gil, Tom, Elis, Geraldo, Baden, João, Rita, Chico, Francis, Vinicius, Adriana, Gal, Bethânia, Menescal, Lupicínio, Nara, Taiguara, Raul, Antônio Carlos, Jocafi, Sá, Guarabyra, Martinho, Paulinho e mais uma infinidade de virtuoses da MPB (falta muito nego bom nessa lista...) quando abriram naturalmente seus espaços para a turma que vinha chegando. Aquela célula sertaneja, servindo a um público sem interesse ou condição intelectual para acessar os movimentos de ruptura, de repente viu-se à vontade para crescer, pois a expectativa por mais erudição – ou mesmo uma manutenção – entre os brasileiros com a chegada de novas e ágeis tecnologias, virou triste regressão e o mau gosto tomou conta de vez. É de chorar em caipira.
Exceções à parte, o que a Educação fez com o Brasil nas últimas décadas? Desde salários “ó!”, professores “hã?”, alunos “aê, profe, vai encará!?” e curiosidades como o sistema que considera “traumática” a reprovação, também no tocante às artes fomos adquirindo gradativamente um insaciável paladar de égua. Meu caro jovem, se consegui segurar você até aqui é bom sinal. Topa submeter-se a uma experiência bem fácil? Vá ao YouTube e ache Construção de Chico Buarque. Aí procure ficar a sós e apague a luz, cale a voz, folgue os nós da gravata, dos sapatos, esqueça a data (Opa! Isso já é Gilberto Gil...) e assimile estrofe por estrofe dessa bela composição – uma formidável catadupa de proparoxítonas com instigante crítica social adaptável a qualquer tempo – que a moçada das baladas da minha época fez chegar aos primeiros lugares. Mais: muitos “hits” eram assim.
Mas a galera achinelou-se e as gravadoras – pragmáticas e boas no mimetismo – fizeram a rápida e providencial leitura ótica do mercado. Nada de pérolas aos porcos. Serviram-lhes a lavagem mesmo, é mais barata e muito bem aceita. Por momentos cheguei a acreditar no famoso ciclo, pelo qual – como a moda, a gastronomia, o cinema, etc. – um dia reviveríamos a música de qualidade. Mas ouvi por aí que Michel Teló vai ser recebido pelos “heróis” do BBB.
E alguns ainda esperam o Apocalipse só lá pro fim do ano...
“Passa pelo universo de cada um”, disse o mestre. E naquela aula, parafraseando Geraldo Vandré, um genial compositor daquele tempo de mudanças, “as visões se clarearam”. Facilíssimo: os diferentes universos aos quais cada um de nós pertence explicam não só a questão do gosto musical, mas os eventuais impasses ao apresentarmos um ponto de vista. O cara com quem você interage não precisa vir de um universo totalmente estranho ao seu, basta haver bagagens desproporcionais de conhecimento e vivência e não haverá diabo no mundo que faça um gostar de Ai Se Eu Te Pego e o outro de Águas de Março...
Minha intriga é com quem tomou os lugares de Caetano, Gil, Tom, Elis, Geraldo, Baden, João, Rita, Chico, Francis, Vinicius, Adriana, Gal, Bethânia, Menescal, Lupicínio, Nara, Taiguara, Raul, Antônio Carlos, Jocafi, Sá, Guarabyra, Martinho, Paulinho e mais uma infinidade de virtuoses da MPB (falta muito nego bom nessa lista...) quando abriram naturalmente seus espaços para a turma que vinha chegando. Aquela célula sertaneja, servindo a um público sem interesse ou condição intelectual para acessar os movimentos de ruptura, de repente viu-se à vontade para crescer, pois a expectativa por mais erudição – ou mesmo uma manutenção – entre os brasileiros com a chegada de novas e ágeis tecnologias, virou triste regressão e o mau gosto tomou conta de vez. É de chorar em caipira.
Exceções à parte, o que a Educação fez com o Brasil nas últimas décadas? Desde salários “ó!”, professores “hã?”, alunos “aê, profe, vai encará!?” e curiosidades como o sistema que considera “traumática” a reprovação, também no tocante às artes fomos adquirindo gradativamente um insaciável paladar de égua. Meu caro jovem, se consegui segurar você até aqui é bom sinal. Topa submeter-se a uma experiência bem fácil? Vá ao YouTube e ache Construção de Chico Buarque. Aí procure ficar a sós e apague a luz, cale a voz, folgue os nós da gravata, dos sapatos, esqueça a data (Opa! Isso já é Gilberto Gil...) e assimile estrofe por estrofe dessa bela composição – uma formidável catadupa de proparoxítonas com instigante crítica social adaptável a qualquer tempo – que a moçada das baladas da minha época fez chegar aos primeiros lugares. Mais: muitos “hits” eram assim.
Mas a galera achinelou-se e as gravadoras – pragmáticas e boas no mimetismo – fizeram a rápida e providencial leitura ótica do mercado. Nada de pérolas aos porcos. Serviram-lhes a lavagem mesmo, é mais barata e muito bem aceita. Por momentos cheguei a acreditar no famoso ciclo, pelo qual – como a moda, a gastronomia, o cinema, etc. – um dia reviveríamos a música de qualidade. Mas ouvi por aí que Michel Teló vai ser recebido pelos “heróis” do BBB.
E alguns ainda esperam o Apocalipse só lá pro fim do ano...
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