sábado, 29 de novembro de 2008

O início

Blumenau 27 de novembro de 2008, depois de vários dias de chuvas enfim uma trégua.

Durante 3 meses e meio, o Vale do Itajaí em SC, foi castigado com um volume de chuvas nunca visto antes, em décadas. O que agravou depois de 3 dias com uma precipitação de 500 mm de chuvas torrenciais que ocasionou a maior tragédia da História de Santa Catarina.
A cidade de Blumenau, que na década de 80, foi arrasada com as enchentes que mudou o rumo de sua História, viu desta vez a cidade mudar por completamente a sua topografia. Com o volume de chuvas os morros se desmancharam como castelos de areia e provocou uma mudança que vai delinear o futuro da cidade no que diz respeito a ocupações e moradias.
A várias semanas atrás, os jornais locais estampavam em suas capas, o que antecedia esta catástrofe "O morro da Corípós esta prestes a cair, 50 familías devem deixar as suas casas."," A queda de uma pedra de 30 toneladas arrastou uma moradia e amassou carros estacionados na rua. "Foi a mão de Deus que me salvou", disse a diarista Maria Pereira, cuja casa foi salva por uma árvore que desviou a trajetória da rocha. Na Rua 2 de Setembro, um buraco se abriu e fechou a pista.", " Casa desaba no Vorstadt Prefeitura decreta situação de emergência na Rua Pedro Krauss Sênior, de onde 30 famílias têm de sair".
As noticias foram piorando com o decorrer das semanas, onde as chuvas não davam trégua. Vários desabamentos mas não se imaginava no que ainda estava pra acontecer.
Na última sexta-feira a chuva tinha se intensificado e permanecido por todo sábado, quando o volume aumentou consideravelmente e sem intervalos, a defesa civil já indicava estado de alerta e sinal de enchente onde os abrigos começariam a ser ativados. A imprensa já apresentava números alarmantes mas as coisas ficaram ainda piores no domingo com o Rio Itajaí-açú em quase 12m. Bom como a cota de cheias na cidade é de 8m, ou seja, quando a primeira rua é atingida no município. Foi criado uma rede de canais locais chamada "Rede da Solidariedade", com os canais FURB TV canal universitário, TV GALEGA canal a cabo local e TVL canal da Câmara de Blumenau. Que prestaram uma grande ajuda à comunidade com pedidos de socorro e atendimento aos flagelados, ou seja, caso alguém estivesse procurando um parente ou amigo, telefonava ou mandava email para uma das 3 emissoras que revesavam na cobertura. Por sua vez o canal RBS TV afiliada da Rede Globo continuava com sua programação normal, somente nos telejornais se falava no que estava ocorrendo.
Quando a situação piorou na madrugada de domingo a "Rede da Solidariedade" já tinha se tornado o único meio de comunicação dos moradores de Blumenau e região, mesmo com mais da metade da cidade sem luz as pessoas que possuiam rádio de pilha podia ter informações da única emissora de rádio funcionando até aquele momento, à rádio FURB FM que fazia parte da "Rede da Solidariedade".
No decorrer da madrugada grande parte da população que não dormia aguardava novas notícias, principalmente sobre parentes e amigos. Isto quando sua casa não estivesse em área de risco, o problema é que desta vez quem estava embaixo tinha receio de ir para lugares altos por conta dos desmoronamentos que se tornaram piores de domingo pra segunda. Bom na segunda-feira o rio se establilizou e durante o resto do dia a imagem era de guerra com o número de mortes aumentando, pessoas ilhadas e ou isoladas e o problema já tinha se tornado o principal assunto dos noticiarios e principais jornais, e então o País ficou sabendo do que estava acontecendo.
Permaneci em casa até quinta-feira a pedido da defesa civil, e me dirigi a um supermercado pois já não tinha muita coisa em casa e aproveitei para visitar um abrigo e levar doações como roupas e um carrinho de bebê de minha filha, fiquei assustado com as cenas em que vi, ruas com muito barro vários centímetros, casas prestes a cair, árvores caídas, muitos barrancos que vieram ao chão e um cenário desolador. Imagino como estaria em áreas que foram mais afetadas, toda a cidade foi alterada, as pessoas com um silêncio e aparências nunca visto antes, as roupas estavam sujas de lama, no supermercado em que estive faltavam funcionários e o que procurei se tornara ouro na cidade "água mineral".
Hoje quinta-feira as pessoas tentam limpar as suas casas e ruas destruídas, mas com uma demonstração de solidariedade e esperança típica do povo daqui.
A pior parte que me reservo a comentar é os furtos e saques de pessoas que não são pessoas, ah e sem contar de comerciantes que aumentaram seus preços e mais de 400%. Fico por aqui e um abraço a todos.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Imagens de Blumenau-enchente 2008





Santa Catarina, 25/11/2008
Lama cobre ruas de Blumenau nesta terça-feira

Solo de via desaba após chuva em Blumenau

Santa Catarina, 25/11/2008
Lateral do clube Vasto Verde, no Bairro da Velha, em Blumenau, desabou após chuva

Imagens de Blumenau-enchente 2008


Blumenau, 26/11/2008
Pessoas caminham nas ruas cobertas de lama.


Blumenau, 26/11/2008
Ruas de Blumenau tomadas pela lama

Abrigo em Blumenau-enchente




Santa Catarina, 25/11/2008
Abrigo foi levantado na Catedral de São Paulo, em Blumenau

Tragédia em Blumenau imagens



Santa Catarina, 25/11/2008
Equipe de resgate busca por sobreviventes de deslizamento de terra no Morro Ristow, em Blumenau


Santa Catarina, 25/11/2008
Moradores observam destruição causada pelo deslizamento

Imagens de Blumenau-enchente 2008






portal terra

O dia seguinte do dilúvio-blumenau 2008


Depois de 4 dias ilhado e seguindo as instruções das autoridades, para que pessoas sem necessidades não saíssem de casa. Tive que contribuir de alguma maneira doando roupas e um carrinho de bebê da minha filha, tive a noção do estrago, ou quase noção do que venho acompanhando pela imprensa local.
A imagem é de destruição com ruas quase intransitáveis, árvores caídas ou para cair, barreiras que vieram abaixo, barrancos prestes a cair, barro pra todo lado e pessoas transitando com galochas e roupas sujas por todos os lados.
Tive em uma base da defesa civil, e constatei que, mesmo nesse desolador quadro de tragédia, o espírito de solidariedade demonstra a força de reconstrução, que começa desde já, mesmo com todos atordoados e com o grande número de perdas humanas.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Tragédia em Blumenau imagens
















O Rádio e o seu valor


Diante do caos instalado na cidade de Blumenau, por conta da enchente que assola a cidade, com quedas de barreiras, ruas interditadas e alagadas, 80% da cidade em baixo d'água, entra em cena aquela figura esquecida e desprezada por muitos. O radinho de pilha dos queridos avôs, que ficou por muito tempo guardado quase perdido, que aparece em um momento de emergência para aqueles que estão isolados, onde esperam socorro e esperança.
Em uma era, onde a tecnologia se expande com uma rapidez assustadora, onde se disputam MP3, MP4, MP5, MP6, MP7, MP8. Eis que o objeto mais cobiçado neste instante é o radinho de pilha do vovô, sim, aquele que muitos imaginavam que era apenas peça de museu, e símbolo de uma geração que não tinham luz elétrica nem internet. então VIVA O RÁDINHO DE PILHA...

domingo, 23 de novembro de 2008

Dia da Consciência Negra em Blumenau

Foi entregue ao poder executivo, um projeto de grande valor histórico e cultural. A criação de mais um feriado municipal, o Dia da Consciência Negra.
Seguindo a mesma tendência de outros municípios brasileiros, que aprovaram o mesmo projeto e assim enriqueceram o debate sobre um tema que merece grande respeito e reflexão pela sociedade.
O Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, foi criado com objetivo, de a sociedade manter viva em sua memória, que o Brasil, foi um país escravocrata por quase 400 anos, e que provocou seqüelas graves que carregamos até os dias atuais, que ainda não cicatrizaram; constatadas nos indicadores sociais das populações negras. O brasileiro que por sua vez costuma não ter memória, inclusive de temas recentes como: a ditadura militar, os casos de corrupção nos governos: Collor, F.H.C, Lula...entre outros. Procura passar uma borracha e esquecer assuntos de relevância. E com isso aumentam a impunidade, e trazem conseqüências graves, como: a falta de identidade e exercício pleno da cidadania. Por isso, não devemos deixar passar em “branco” a morte do maior líder negro da História, Zumbi dos Palmares.

Poesia da Mente

Poema DA MENTE Affonso Romano de Sant`AnnaHá um presidente que mente,Mente de corpo e alma, completa/mente.
E mente de maneira tão pungenteQue a gente acha que ele, mente sincera/mente,
Mais que mente, sobretudo, impune/mente...Indecente/mente.E mente tão nacional/mente,Que acha que mentindo história afora,Vai nos enganar eterna/mente.

Ditadura Militar 64 - O pesadelo não acabou

A memória condenapor Gilberto Nascimento O debate sobre a punição a torturadores e a interpretação da Lei da Anistia desatam a irritação dos quartéis e a tensão política. Felizmente, há quem resistaOs militares aproveitaram uma manifestação do presidente Lula para contra-atacar. Durante evento na sede da União Nacional dos Estudantes (UNE) e, em seguida, no encontro com comandantes das Forças Armadas, Lula procurou diminuir o impacto sobre a punição a torturadores da ditadura. Disse que, em vez de xingar os algozes, deveríamos tratar os mortos não como vítimas, mas heróis. As casernas interpretaram a frase como um sinal de que a Presidência quer o fim de qualquer discussão a respeito dos crimes cometidos naquele período.Mero desejo. Ainda que Lula tenha contemporizado diante do comando militar, não seria possível interromper o debate. A bola não está com o Executivo, apesar de o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, terem defendido publicamente punições, mas nos pés do Ministério Público Federal e do Judiciário. E não só.Se a Justiça brasileira entender que os militares autores de crimes como tortura, assassinatos e desaparecimentos forçados não devam ser punidos, isso não significa necessariamente que o caso estará encerrado. Torturadores e mandantes podem ser processados em outros países e receber, por exemplo, a mesma condenação que alvejou o ditador chileno Augusto Pinochet. Morto em 2006, Pinochet foi preso dois anos antes na Inglaterra, a pedido do juiz espanhol Baltasar Garzón, por causa de crimes cometidos pela ditadura no Chile. Garzón, coincidentemente, estará em São Paulo na segunda-feira 18, justamente no momento em que o debate esquenta no País. O juiz é a estrela do seminário Direito à Memória e à Verdade, organizado por CartaCapital e pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos.Decisões semelhantes à que atingiu Pinochet podem vir a ser tomadas por outros países europeus. Na Itália já se desenvolvem investigações que apontam 13 militares e policiais brasileiros como responsáveis pelos seqüestros dos ítalo-argentinos Horacio Domingo Campiglia e Lorenzo Ismael Viñas, então militantes do grupo esquerdista Montoneros, considerados desaparecidos políticos. Campliglia desapareceu junto com a argentina Mónica Pinus de Binstock no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, em 13 de março de 1980. Viñas desapareceu em 26 de junho do mesmo ano, em Uruguaiana (RS). Os dois seqüestros fizeram parte da Operação Condor, uma espécie de força-tarefa dos órgãos de repressão de ditaduras da América do Sul nas décadas de 1970 e 1980. A Itália pediu a extradição de 140 militares e policiais sul-americanos envolvidos em seqüestros, mortes e torturas de militantes com cidadania italiana. Entre os processados estão os treze brasileiros. O Ministério Público Federal no Brasil também encaminhou pedidos para apuração desses seqüestros, a fim de punir os responsáveis, e aguarda informações oficiais sobre as investigações da Itália.A França pode reclamar o desaparecimento de Jean Henry Raya, cidadão que vivia em Buenos Aires e veio ao Brasil a passeio em 14 de novembro de 1973, no auge da repressão política da ditadura brasileira. Raya passou por Uruguaiana no dia 18 daquele mês, vindo de Paso de Los Libres, território argentino. De lá, telefonou para sua mulher, Mabel, na Europa. Do apartamento na avenida Atlântica, no Rio, onde estava, Raya contatou amigos em Buenos Aires, por telefone. Foram as últimas notícias sobre seu paradeiro. A França acionou a embaixada brasileira em Paris, mas nada mais se soube dele. A família contratou um advogado no Brasil e buscou informações, sem sucesso. Outro caso está prestes a ser esclarecido e tem mobilizado entidades de familiares de presos e desaparecidos políticos no Brasil, na Venezuela e na Espanha. Envolve o cidadão espanhol Miguel Sabat Nuet, preso por uma equipe do antigo Dops (Departamento de Ordem Política e Social) para “averiguação de subversão”, na estação de trem Barra Funda, zona oeste de São Paulo, no dia 9 de outubro de 1973.Nuet foi sepultado um mês e meio depois como indigente, na cova 485 da quadra 7 do cemitério Dom Bosco, em Perus, zona oeste paulistana, ao lado dos corpos de dois guerrilheiros, Antonio Carlos Bicalho Lana e Sônia Maria de Moraes Angel Jones, mortos sob tortura. Familiares na Espanha e na Venezuela – onde moram seus três filhos – querem que o governo espanhol exija explicações do Brasil sobre sua morte. A família encaminhou um pedido de ajuda a Garzón. À CartaCapital o magistrado disse não estar investigando o caso no momento (entrevista à pág. 16). O juiz tem um histórico de investigações de mortes de cidadãos espanhóis pelas ditaduras do Chile e da Argentina. A Comissão de Familiares de Presos e Desaparecidos Políticos no Brasil encaminhou uma solicitação à Federação Latino-Americana de Associações de Familiares de Desaparecidos (Fedefam), sediada em Caracas, para auxiliar os parentes de Nuet a formalizar na Espanha um pedido de investigação. Essa possibilidade torna-se mais factível atualmente em razão de uma corte espanhola ter decidido que qualquer violação de direitos humanos deve ser reprimida por todos os tribunais do país, em qualquer lugar do mundo, envolva ou não cidadãos espanhóis. Por aqui há uma apuração sobre o caso Nuet em andamento. Seus restos mortais foram exumados em abril último, a pedido de procuradores federais. Com a identificação, a procuradoria pretende responsabilizar civilmente o comandante do DOI-Codi (Departamento de Operações de Informações e Centro de Operações de Defesa Interna) de São Paulo à época, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. O coronel é responsável por um sistema integrado de repressão política que envolvia também o Dops. Na área criminal, pretende-se responsabilizar os agentes públicos envolvidos na morte e ocultação do cadáver.Exames de DNA estão sendo feitos no laboratório Genomic, em São Paulo, para confirmar se a ossada encontrada na vala é realmente do espanhol. O resultado deve sair em um mês. Foram coletadas, a pedido do Ministério Público Federal, amostras de sangue de um irmão de Nuet, Carlo Sabat Nuet, de Barcelona, na Espanha, e de um dos filhos, Miguel Sabat Diaz, que vive em Caracas. Nascido em Barcelona, Nuet, então com 50 anos, tinha cidadania venezuelana. Era representante de uma empresa de casas pré-fabricadas e de uma marca de automóveis. Morava em Caracas havia 23 anos e decidiu deixar a Venezuela por se sentir perseguido. Isso foi descoberto a partir de cartas que estavam em seu poder e escritas de próprio punho, encontradas nos arquivos secretos do Dops de São Paulo, abertos em 1991. Ele não tinha ligações, ao menos conhecidas, com qualquer organização de esquerda.Nas cartas, o espanhol, católico fervoroso, dizia-se autor da filosofia Hectólogos para La Paz y La Fraternidad Universal. Em razão de sua teoria, que contrariava a Igreja, sentia-se perseguido. “Nesses escritos, ele parecia muito tenso e perturbado”, lembrou Suzana Lisboa, da Comissão de Familiares de Desaparecidos Políticos, que encontrou as correspondências. A alegação oficial para a morte de Nuet foi suicídio. Segundo agentes da repressão, ele teria se enforcado na carceragem, um mês e meio depois da prisão. A ex-presa política Sonia Miriam Draibe, então militante do grupo de esquerda Polop (Política Operária), estava próxima da cela de Nuet e contou ter ouvido gritos em espanhol pedindo ajuda. Suzana Lisboa acredita que Nuet possa ter sido assassinado por ter testemunhado a morte sob tortura dos presos Bicalho Lana e Sônia Angel. Contatada por CartaCapital, em Valência, a cerca de duas horas de Caracas, a filha de Nuet, Maria Del Carmen, 54 anos, administradora de empresas, disse nem saber qual era a atividade do pai. Ela não acredita que ele tivesse qualquer tipo de atuação política ou religiosa. “Nunca soubemos nada dessas atividades”, disse Carmen. Ela quer a apuração do caso e espera a ajuda do governo ou do Judiciário espanhol. “Tentamos falar com o juiz Garzón, mas não conseguimos. Os assessores dele mandaram uma carta dizendo que não caberia ao juiz tomar a iniciativa da investigação”, afirmou. Carmen pretende pedir indenização ao governo brasileiro e solicitou instruções nesse sentido à Comissão de Familiares de Desaparecidos. A retomada das iniciativas do Ministério Público em desvendar crimes da ditadura aumentaram as chances de o caso Nuet ser esclarecido. Ações de entidades de direitos humanos e eventuais pedidos de esclarecimentos de países como Itália e Espanha se constituem num complicador a mais para os que advogam o esquecimento dos crimes praticados pelos militares durante o regime.De outro lado, aumentam as pressões para que o debate sobre eventuais punições a torturadores seja enterrado com suas vítimas. Elas partem sobretudo dos meios militares. Mas não só. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, que, a exemplo do antecessor Marco Aurélio Mello, é acometido de parlapatice diante dos holofotes, fez questão de meter a colher no assunto.Segundo Mendes, a abertura dos arquivos da repressão em países da América Latina “não é a melhor (solução), tanto é que eles não produziram estabilidade institucional”. E prosseguiu: “Ao contrário, eles têm produzido ao longo dos tempos bastante instabilidade”.As experiências internacionais desautorizam a interpretação do magistrado. O Chile e a Argentina puniram seus torturadores sem nenhuma celeuma, crise ou desarranjos institucionais. Um estudo da pesquisadora norte-americana Kathryn Sikkink mostrou que até a violência policial diminuiu nos países onde houve sanções a repressores, pois deixou de haver a sensação de impunidade na sociedade.Mas Lula, sempre conciliador, pediu a Tarso Genro que encerrasse a polêmica com os militares. “Toda vez que falamos dos estudantes e operários que morreram, falamos xingando alguém que os matou quando, na verdade, esse martírio não vai acabar se a gente não aprender a transformar nossos mortos em heróis e não em vítimas”, discursou. Ironicamente, Lula fez essa análise durante um ato que indenizava a União Nacional dos Estudantes (UNE) pela demolição de sua sede durante a ditadura.É um tom ameno, bem diferente do usado pelos participantes de um ato no Clube Militar, no Rio de Janeiro, em 31 de julho. Oficiais da ativa e da reserva disseram, em documento distribuído ali, que se houvesse mesmo interesse em debater problemas nacionais os ministros Genro e Vannuchi deveriam se preocupar com “os inúmeros escândalos protagonizados por figuras da cúpula governamental” ou “a gravíssima suspeita de envolvimento de alguns deles com as Farc (grupo guerrilheiro colombiano)”. Manifestações durante o evento foram bem mais jocosas e violentas. Em alguns momentos, o clima lembrou aquele das vésperas do golpe de 1964.A frase de Lula decepcionou militantes dos direitos humanos. “O presidente terá uma mancha muito grande na sua história por não ter aberto os arquivos da ditadura e por não ter encarado de frente essa questão”, lamenta Suzana Lisboa. “Ele recorreu contra uma ação para reconhecer a existência da guerrilha do Araguaia e nunca cumpriu sentença da Justiça sobre esse caso favorável aos pedidos dos familiares.”Antes da fala apaziguadora de Lula, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, já havia dado o recado. Disse que a punição a torturadores não havia sido discutida no governo. “Não haverá mudança na Lei de Anistia. Não existe hipótese de rever uma lei passada”, acentuou o ministro, cometendo equívoco alimentado pela imprensa nos dias seguintes. Ninguém fala em mudança da lei, e sim que a Anistia não contempla os torturadores. Tortura é crime contra a humanidade e, portanto, imprescritível, como definem os tratados e convenções sobre o tema assinados pelo Brasil. Outro dado passou despercebido. A Lei de Anistia não foi autoconcedida. Os ex-presos políticos a pediram e, para isso, assumiram os eventuais crimes cometidos. “Nenhum torturador fez isso. Se eles não pleitearam e seus casos não foram analisados, como podem ser anistiados?”, questiona Suzana Lisboa. A anistia não foi “ampla, geral e irrrestrita”, como se reivindicava no início da abertura política, lembrou a ativista. Aqueles que cometeram os chamados “crimes de sangue” ficaram presos por mais tempo e só saíram da cadeia em liberdade condicional. Nenhum torturador teve seu caso analisado para saber se teria direito a um ou a outro benefício.Diante da polêmica, o Judiciário analisa o tema tecnicamente. Mas também se divide. Na terça-feira 12, o desembargador De Santi Ribeiro, da 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, votou pela continuidade de uma ação movida contra o coronel Brilhante Ustra pela família do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, morto no DOI-Codi em 1971. O objetivo é responsabilizar Ustra pela morte de Merlino. Sete dias antes, o desembargador Luiz Antonio de Godoy havia acolhido recurso impetrado pelo coronel para arquivar o processo. Agora, há empate. O desembargador Elliot Akel, terceiro a analisar o caso, vai se pronunciar na terça-feira 19.

Discurso no mercado do desemprego

Talvez perca — se desejares — minha subsistênciaTalvez venda minhas roupas e meu colchãoTalvez trabalhe na pedreira... como carregador... ou varredorTalvez procure grãos no estercoTalvez fique nu e famintoMas não me vendereiÓ inimigo do solE até a última pulsação de minhas veiasResistireiTalvez me despojes da última polegada da minha terraTalvez aprisiones minha juventudeTalvez me roubes a herança de meus antepassadosMóveis... utensílios e jarrasTalvez queimes meus poemas e meus livrosTalvez atires meu corpo aos cãesTalvez levantes espantos de terror sobre nossa aldeiaMas não me vendereiÓ inimigo do solE até a última pulsação de minhas veiasResistireiTalvez apagues todas as luzes de minha noiteTalvez me prives da ternura de minha mãeTalvez falsifiques minha históriaTalvez ponhas máscaras para enganar meus amigosTalvez levantes muralhas e muralhas ao meu redorTalvez me crucifiques um dia diante de espetáculos indignosMas não me venderei Ó inimigo do solE até a última pulsação de minhas veiasResistireiÓ inimigo do solO porto transborda de beleza... e de signosBotes e alegriasClamores e manifestaçõesOs cantos patrióticos arrebentam as gargantasE no horizonte... há velasQue desafiam o vento... a tempestade e franqueiam os obstáculosÉ o regresso de UlissesDo mar das privaçõesO regresso do sol... de meu povo exiladoE para seus olhosÓ inimigo do solJuro que não me vendereiE até a última pulsação de minhas veiasResistireiResistireiResistirei